As quadrilhas juninas deixaram de ser apenas a manutenção de uma tradição da cultura popular; elas se profissionalizaram. Todas as quadrilhas, ou pelo menos as maiores delas, possuem uma gama de pessoas especializadas, profissionais e técnicos necessários para a construção do espetáculo junino. Figurinistas, coreógrafos, músicos, cabeleireiros e maquiadores são alguns dos trabalhadores que agem nos bastidores desses grupos.
Em Juazeiro do Norte, um dos grupos de quadrilhas de berço tradicional e que se profissionalizou ao longo do tempo é a famosa Nação Nordestina. Campeã estadual do ano passado, o grupo compete em vários festivais. Mesmo atuando em uma época específica, a junina, o espetáculo é resultado de um trabalho iniciado meses antes. Ao todo, levam-se entre cinco e seis meses para a preparação. Segundo Victor Lima, diretor e produtor cultural da Nação Nordestina, o trabalho é contínuo. “A Nação não para nunca. Enquanto a temporada acaba, os trabalhos continuam; aí entram os projetistas já com ideias para os próximos anos”, disse.
Grupos de quadrilhas juninas envolvem dinheiro, tempo e dedicação. Com a profissionalização, os brincantes envolvidos no espetáculo conseguem também experiências laborais e oportunidades antes não tidas. Parte desses profissionais, embora nascidos no universo junino, muitas vezes não possui emprego fixo. Nesse sentido, os brincantes veem no movimento uma oportunidade de desenvolverem novas habilidades, como figurinistas, coreógrafos, cabeleireiros e maquiadores. Victor frisa que esse é o outro lado que o mundo junino oferece. “O mundo junino oferece essa possibilidade de você conseguir se tornar um profissional na área em que você tem afinidade”, ressaltou.
O movimento quadrilheiro também proporciona um impacto social positivo. Ao alcançar um público mais amplo de crianças e adolescentes, as quadrilhas utilizam a arte, a cultura e a dança para afastá-los de caminhos potencialmente negativos, como o uso de drogas e o envolvimento com a criminalidade. Esta expressão cultural não só é benéfica e saudável, mas também fortalece o orgulho de fazer parte de um grupo junino local, oferecendo a oportunidade de se apresentar e conhecer pessoas ligadas ao ramo em outras cidades e estados.
O período de preparação intensa ocorre principalmente em maio, já que os campeonatos começam em junho. Em Juazeiro do Norte, além do festival municipal, outros eventos são organizados por diversas instituições, proporcionando oportunidades para os moradores locais participarem e assistirem a apresentações de grupos de fora. O movimento junino não apenas beneficia os próprios quadrilheiros, mas também é lucrativo para os vendedores ambulantes que participam dos eventos juninos.
O incentivo público às quadrilhas
A gestão municipal também apoia financeiramente os grupos juninos, concedendo subsídios tanto para quadrilhas adultas quanto infantis. Esse apoio se estende também às esferas estaduais e federais, por meio das leis de incentivo à cultura, como a Lei Paulo Gustavo e a Lei Rouanet. Essas legislações favorecem mais projetos contemplados, com valores que variam entre 18 mil e 22 mil reais. Alguns grupos de quadrilha que concorrem a esses incentivos conseguem ser contemplados, mas passam por um rigoroso processo de seleção de projetos.
O município desempenha um papel crucial na promoção e manutenção da cultura junina, algo que, segundo Victor Lima, coordenador e produtor da Nação Nordestina, nem sempre foi visto em todas as administrações anteriores. “A gestão tem um papel fundamental na manutenção da cultura junina, porque nós precisamos enxergar que eles estão ali nos reconhecendo e sabendo que existimos”, afirma.
À medida que o movimento das quadrilhas se tornou mais organizado, os custos também aumentaram consideravelmente. Com o aumento dos salários, os gastos com materiais necessários para os espetáculos juninos também aumentaram proporcionalmente. Com a profissionalização dos grupos, a dinâmica de trabalho mudou significativamente, exigindo espetáculos mais elaborados, com estruturas e figurinos mais sofisticados, o que naturalmente implica em maiores custos financeiros.
Quando os grupos não conseguem patrocínio por meio dos incentivos públicos, eles se mobilizam de outras formas, buscando apoios alternativos ou organizando eventos como rifas, bingos e vendas de comida para custear os gastos com figurinos, transporte, materiais e espaços para ensaios, além de financiar as viagens para competições.
Victor Lima ressalta que as quadrilhas se destacam em um contexto que antes não era uma realidade, tornando-se símbolos de resistência cultural. “Antigamente, dançar não era levado tão a sério. As mobilizações eram mais discretas e se ambientavam em um nível de ‘mesquinharia’ ao pedir ou buscar ajuda. Tirava-se do próprio bolso e se faziam muitas mobilizações internas entre os próprios grupos, como já citado”, afirmou.
Apesar dos desafios enfrentados, as quadrilhas continuam vivas e atuantes na cultura, reunindo crianças e jovens que transformaram o divertimento inicial em um movimento que transcende as fronteiras locais. A resistência cultivada ao longo da história tornou-se o estandarte desses grupos, que a cada novo espetáculo montado, reafirmam sua importância.