Matrículas caem na pandemia e Ceará tem mais de 29 mil crianças de 4 e 5 anos fora da pré-escola

O acesso à escola pública ou privada é direito básico de crianças e, a partir dos 4 anos de idade, uma tarefa obrigatória dos pais. No Ceará, porém, a taxa de matrículas na pré-escola caiu, na pandemia – e cerca de 29 mil cearenses de 4 e 5 anos estavam fora da pré-escola em 2021.

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Os dados são de estudo da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal (FMCSV), divulgados na manhã desta quarta-feira (21) e baseados em levantamentos oficiais sobre as redes de ensino brasileiras.

A pesquisa aponta que em 2019, ano pré-pandêmico, 92,5% das crianças de 4 e 5 anos cearenses estavam matriculadas na pré-escola, percentual que caiu para 88,8% em 2021. Isso aponta que 11,2% das crianças nessa faixa etária estão fora das salas de aula.

29.236 crianças de 4 a 5 anos do Ceará estavam fora da pré-escola em 2021, o que equivale a 11,2% dos 261.043 cearenses nessa faixa etária.
Esmeralda Macana, especialista em Monitoramento e Avaliação do Itaú Social e integrante do estudo, destaca que um dos principais motivos para a queda de matrículas na pré-escola foi a perda de renda pelas famílias.

“A baixa de matrículas na pré-escola está muito mais impactada na rede privada. A queda de renda, o desemprego e mães ficando mais em casa são alguns fatores para não levar essas crianças à escola”, pontua.

Outra hipótese é um desengajamento e falta de priorização com a aprendizagem nesta etapa, porque foram quase 2 anos sem contato com a escola, com os professores. Muitas vezes se entende que a criança não precisa estar na escola nessa idade.

ESMERALDA MACANA

Especialista em Monitoramento e Avaliação do Itaú Social

Toda criança brasileira, ao completar 4 anos até março do ano corrente, deve estar regularmente matriculada em alguma rede de ensino. Universalizar esse acesso até 2016, aliás, era a meta número 1 do Plano Nacional de Educação (PNE). E não foi cumprida no Ceará.

“Os desafios são gerais, mas muito intensos em populações mais vulneráveis. Atender a meta do PNE não é a prioridade, mas sim olhar pras desigualdades. O Ceará se destaca na educação, mas será que existem municípios e crianças que exigem mais atenção em termos de desigualdade?”, questiona Esmeralda.
Não podemos mais naturalizar as desigualdades. Em Sobral, por exemplo, as crianças de nível socioeconômico mais baixo aprenderam em língua portuguesa só metade (26%) do que as de nível mais alto (53%).

ESMERALDA MACANA

Especialista em Monitoramento e Avaliação do Itaú Social

O estudo da FMCSV mostrou ainda indicadores de saúde das crianças cearenses: em 2021, 3,6% delas estavam abaixo ou muito abaixo do peso. Além disso, 10 vacinas básicas da primeiríssima infância não atingiram a meta.

“É preciso olhar para a intersetorialidade entre os indicadores. O Ceará deve focar os esforços nas crianças mais pobres”, frisa a especialista.

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Marina Fragata, diretora de conhecimento aplicado da FMCSV, acrescenta que “a primeira infância é uma janela de oportunidades”, uma vez que “90% das conexões são estabelecidas até os 6 anos, quando adquirimos habilidades que perduram pela vida toda”.

Garantir o acesso à educação infantil e trabalhar muito fortemente na busca ativa é bem importante tanto na creche como na pré-escola, etapa esta que é obrigatória. A educação infantil tem forte impacto nos anos seguintes.

MARINA FRAGATA

Diretora de conhecimento aplicado da FMCSV
A psicopedagoga Ticiana Santiago, professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), observa que “muitos pais acabaram desconsiderando a importância da educação básica”, na pandemia, e lista os motivos pelos quais é importante promover acesso à educação desde cedo.

O que deve ser feito
Marina Fragata, especialista da FMCSV, lista 4 medidas prioritárias que governos de diversos níveis devem adotar para mitigar os prejuízos educacionais, sociais e até sanitários que a pandemia deixou às crianças:
Priorizar de forma absoluta crianças na primeira infância;
Investir em políticas públicas para mulheres mães de crianças de 0 a 6 anos;
Combater de forma urgente as desigualdades sociais e raciais;
Olhar de forma atenta para questões regionais e territoriais.

Já Esmeralda, do Itaú Social, adiciona que “garantir a escola não é suficiente: é preciso que a criança permaneça. E, para isso, precisa estar alimentada, ter boa saúde e se sentir segura”.

Sobre o contexto cearense, a professora Ticiana Santiago reforça a importância de garantir investimentos e “formação continuada dos professores, pra que entendam e reforcem as especificidades e importâncias da educação básica”.

A psicopedagoga alerta, ainda, para a necessidade de pensar a educação de uma forma global.

“O suporte à família na primeira infância é importantíssimo pra que a criança consiga ter uma rede de apoio. É preciso pensar que a educação está conectada com fatores de classe, raça e gênero. Saúde, assistência social e educação precisam ser pensadas em rede”, finaliza.

O que diz o poder público
No Ceará, essa intersetorialidade é a base do programa Mais Infância, que funciona em 4 eixos – Tempo de Nascer, Tempo de Crescer, Tempo de Brincar e Tempo de Aprender – e é gerido, entre outras Pastas, pela Secretaria de Proteção Social, Justiça, Mulheres e Direitos Humanos (SPS).

Embora as pesquisadoras ouvidas nesta reportagem destaquem que a queda das matrículas na pré-escola é puxada pela rede privada, o Diário do Nordeste questionou a SPS e a Secretaria Estadual da Educação (Seduc) de que forma têm acompanhado os indicadores de acesso infantil à pré-escola e apoiado os municípios na garantia desse .

Foto: Fábio Oliveira/Prefeitura de Várzea Alegre / Fonte: Diário do Nordeste

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